Vinha, eu, pela Rua 46, também chamada de Little Brazil, em uma quarta feira absurdamente quente, pensando em como é bom ter amigos. Havia recebido, alguns dias antes, um e-mail de um deles, me cumprimentando por uma crônica que escrevi sobre um sonho, onde Selminha – uma musa de minha juventude – era a protagonista. Nesse sonho eu jogava pelo Brasil na Copa de 1950, fazendo dois gols contra o Uruguai… Ganhamos a Copa e eu, a Selminha…
Entro em um restaurante brasileiro, são 11:30 da manhã, e álcool só pode ser servido depois do meio dia. O garçom, o qual tratei sem cobrar de uma infecção que não quero mencionar aqui, coloca diante de mim um chope estupidamente gelado com pouca espuma. De repente me lembro de que prometi para minha filha não beber mais álcool. Vácilo. Não sei o por quê dessa promessa. Água mineral com gás, muito gelo, limão e uma gota, sim, uma gota, de vinagre de maçã.
No bar, assisto o noticiário político, Marina empatou com Dilma. Eu ainda trago comigo o PT dos anos 1980. Quero viver essa ilusão. Católicos, muitos, não deixaram a Igreja com o escândalo da pedofilia. Por que eu devo desistir do meu sonho?
Agora a televisão fala da delação da Petrobrás. Não aparece nenhum nome do PSDB. Gente honesta esse pessoal dos Tucanos, tão honestos que privatizaram o Brasil por preço de banana.
De repente sentam perto de mim duas senhoras, turistas, carregadas de sacolas e bolsas Prada. A mais próxima tem o cabelo todo branco, pele enrugada pelo tempo e um peso que castiga a balança. A outra, um pouco mais jovem, ou talvez mais conservada, tem um ar mais autoritário. Percebo que estão de mãos dadas e ligeiramente trocam um beijinho.
O noticiário continua, e uma delas fala em voz alta e cheia de orgulho: – Honesto mesmo era o Itamar da nossa Juiz de Fora.
– JF? Volto-me a elas e então percebo pintinhas suavemente escuras na comissura labial esquerda da senhora de cabelos brancos. Vou aos olhos e vejo aquele verde mar do fim do dia.
-Selma? – Sim, quem é você? Selma sou, eu, o Sady, lembra de mim? Eu sempre ajudava sua avó a carregar as compras da feira (quando você estava junto, pensei).
– Meu Deus, Sady. Como você envelheceu. E os cabelos? Você era tão bonitinho.
Não sei se fico alegre com o bonitinho ou pergunto a ela onde está aquela cinturinha que combinava com aquela… Mas, fico quieto.
Começamos então a falar de JF. Do nosso tempo. Crio coragem e conto a ela do meu sonho, dos gols que marquei pelo Brasil.
Depois do meu terceiro chope ( tive um recaída), mais corajoso, a lembro daquela terça feira de Carnaval que, quando a banda tocava a Máscara Negra, eu a pedi em namoro, e ela, com o se desse uma punhalada, me respondeu: Sady , você e muito baixinho para mim.
Selma olhou fundo no meus olhos e, então, disse: – Foi mentira minha, Sady, eu não namorei com você porque amava a Margarida. Deixo as duas falando dos carnavais de JF. Caminho para o metro pensativo e não posso deixar de pensar em Forest Gump: A vida é como uma caixa de Chocolate.
Sady Ribeiro Medico
Intervencionista na área de dor.
New York