Fonte foto –Wikipédia, a enciclopédia livre – “Negres a fond de calle” (“Navio negreiro”) de Johann Moritz Rugendas. Imagem da tela de Johann Moritz Rugendas, de 1830, que narra um episódio da história em que os negros eram trazidos em navios negreiros após capturados na costa da África.
Por Adinaldo Souza.
A pauta do momento é a admissão do presidente português Marcelo Rebelo dos crimes cometidos por Portugal no transcorrer dos sequestros de homens, mulheres e crianças em África e a consequente escravização destes humanos seres negros no cativeiro chamado Brasil. E mais, admite também que o pedido de desculpa e muito fácil e que tem que haver reparação.
Fonte foto – Wikipédia, a enciclopédia livre – Presidente Português Sr. Marcelo Rebelo de Sousa.
Ora, faz-se necessário contextualizar esta súbita manifestação do presidente de Portugal; pois entre os dias 16 e 19 deste mês de abril de 2024, na ONU, em Genebra, Suíça, foi realizada a terceira sessão do Fórum Permanente das Pessoas Afrodescendentes que tem entre suas funções contribuir para os direitos econômicos, sociais, culturais, civis e políticos da população afrodescendente pelo mundo afora, bem como, discutir a elaboração de uma Declaração das Nações Unidas sobre a promoção, proteção e respeito pleno aos direitos humanos das pessoas afrodescendentes. A Ministra da Igualdade racial, Anielle Franco, juntamente com inúmeras organizações do movimento negro, cobrou uma postura mais firme de Portugal sobre este tema.
Fonte foto – Wikipédia, a enciclopédia livre – Anielle Franco.
É importante salientar que sob a égide dos governos do presidente Lula e Dilma algumas políticas de ações afirmativas tem sido implementadas, à exemplo das cotas para as pessoas negras nas universidades públicas federais e nos serviços públicos federais e suas autarquias, e, atualmente foi anunciado o programa “Juventude Negra Viva”.
Mas a pergunta em questão é como Portugal fará tão tardia e imprescindível reparação? Primeiro: é importante sublinhar que ao menos em tese, a África é o berço da humanidade, logo pode-se afirmar que os 8 bilhões de humanos hoje na terra é em maior ou menor grau afrodescendentes. Todavia o racismo persegue e desumaniza as pessoas que tenham em seu fenótipo características negroides visíveis e não imaginárias, portanto são para estas pessoas que a política de reparação deve ser destinada. Nunca é demais lembrar que vez ou outra aparece no noticiário casos de candidatos às políticas de ações afirmativas vistos como brancos em nossa sociedade e se apresentando como negros, ou seja, sendo negros por conveniências para burlar quem de direito seria beneficiado. Segundo: é importante destacar para rebater as resistências racistas que eventualmente advirão que há precedentes históricos na política de reparação e aqui sito duas que a meu ver foram exitosas:
Escravos descansando na casa de um senhor, no caminho para outra fazenda, 1830, por Rugendas.
1 – Em novembro de 2012 o governo alemão aprovou um aumento das indenizações pagas aos sobreviventes do Holocausto cujos principais beneficiários foram os da comunidade judaica da Europa Oriental. A iniciativa coincidiu com o 60º aniversário do “Acordo de Luxemburgo” onde a Alemanha Ocidental havia assumido a responsabilidade pelo Holocausto e concordado em fornecer reparações financeiras aos sobreviventes judeus. Desde 1952 até aquele novembro de 2012 a Alemanha já havia pago pelos crimes praticados pelos nazistas a quantia de US$ 89 bilhões.
Fonte foto – Wikipédia, a enciclopédia livre. – Judeus na rampa de seleção em Auschwitz, maio de 1944.
2 – A partir de 1942, por ordem do presidente americano Franklin D. Roosevelt, os Estados Unidos implantaram os “campos de internamento”, que segundo alguns historiadores é mero eufemismo para “campos de concentração”; para onde foram destinados os cerca de 120.000 cidadãos americanos descendentes de japoneses, em virtude da segunda guerra mundial. Isto resultou numa crescente discriminação racial contra esta comunidade. O americano que possuísse 1/16 de ascendência japonesa era transferido para esses campos. Em 1988 o presidente Ronald Reagan, mediante forte campanha da comunidade nipo-americana, desculpou-se pela investida e indenizou os sobreviventes do campo em US$ 20.000,00.
Fonte foto – Wikipédia, a enciclopédia livre. Manzanar é o mais conhecido dos dez campos de concentração onde mais de 110 000 norte-americanos nikkei foram encarcerados durante a Segunda Guerra Mundial. Fica aos pés da Serra Nevada no Vale Owens, Califórnia, e entre os povoados de Lone Pine a sul e Independence a norte, aproximadamente a 370 quilômetros a nordeste de Los Angeles.
É de se entender que a reparação portuguesa, além da indenização financeira, deve ser conjugada com valores determinantes da realidade histórica e cultural destes povos sequestrados e naturalizados como objetos de comercio legal, pois o proposito mor é o combate ao racismo e reeducar a sociedade é o caminho também a ser trilhado, pois ainda hoje, tanto em Portugal como aqui no Brasil, os descendentes do sistema escravagista continuam a usufruir da riqueza então produzida. Também é importante discernir que no caso de Portugal e do Brasil numa eventual guinada à governos de direita, dificilmente esta reparação se efetivará, pois os racistas de lá são os mesmos daqui.
Fonte foto = https://pt.wikipedia.org/wiki/Escravid%C3%A3o_no_Brasil#/media/Ficheiro:Debret_casa_ciganos.jpg
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Adinaldo Souza.
Adinaldo Souza: Poeta, cronista e colaborador do nosso Jornal Vida Brasil Texas, desde 2009 .
Texto interessantíssimo, parabéns maninho, uma verdadeira aula e incentivo à reflexão. 👏🏾👏🏾👏🏾👏🏾