Por: Osvaldo ‘Tetaze’ Maia!
Hoje vou contar algumas das passagens que tive na Copa do Mundo de 1986 no México, quando o futebol arte do Brasil ainda prevalecia sobre as demais equipes da época, devido ao futebol que o Brasil apresentara na Copa da Espanha em 1982 e considerada por muitos como a melhor seleção brasileira de futebol até hoje.
Meu relacionamento com a seleção Brasileira iniciou na década de 80 e em 1982 na Espanha, assisti minha primeira Copa do Mundo ‘dos bastidores da seleção’, devido a minha amizade com os saudosos Gilberto Tim, preparador físico, e Dirceu, o “ponta esquerda”. Fato é que, jamais a seleção Brasileira será como naquela época, e não falo somente do futebol em si, mas da forma como se comportavam os jogadores e a própria estrutura da seleção, que ainda não tinha atingido o ‘glamour’ de hoje, nem os ‘valores’ atuais do mercado do futebol, e assim, os jogadores não detinham o ‘estigma de pop-star’ de hoje em dia! Então vamos a um dos episódios que convivi na Copa do México 1986.
Lembrem-se que em 1986 fazia somente 16 anos que o Brasil tinha sido tri-campeão mundial, lá mesmo no México em 1970, e que o goleador daquele mundial foi o Jairzinho, o ‘Furacão da Copa’, que em 1986 tinha 42 anos e jogava ainda muita bola. Como já tinha feito amizade com o Jairzinho através do futebol, combinamos que nos encontraríamos em Guadalajara, juntamente com o nosso amigo em comum ‘Betinho’, ex-jogador carioca, músico e por fim ator de novela na década de 70, que vivia em Los Angeles naquela época.
Assim, eu, o Betinho e o ‘Jair Ventura Filho’, como o Betinho chamava o Jairzinho, montamos “La selección brasileña de ex jugadores de fútbol” com a qual jogamos sete partidas durante os trinta dias em que permanecemos em Guadalajara, única sede da seleção brasileira naquele mundial!
Estes sete jogos em Guadalajara, pode-se dizer que na época fizeram tanto (ou quase tanto) sucesso na cidade quanto os jogos do mundial, pois jogávamos nos intervalos dos jogos do Brasil, e assim, a ‘torcida’ tinha outra atração para ver, pois a equipe que montamos, modéstia a parte (bem, talvez com um pouquinho de exagero), faria frente a algumas seleções daquele mundial.
Formaram a base daquele time, Jairzinho, ‘Pato Lucas’, irmão do ex-jogador Muller e que jogava no Universidad Guadalajara naquela época, ‘Dito’, outro irmão do Muller que jogava em Mato Grosso, Sérgio Lima, ex America do Rio, Inter de Porto Alegre, e Guarani de Campinas, dentre outros times do Mexico, Fred, ex Flamengo e seleção olímpica brasileira de 1972 em Munique, Rildo, ex Santos (aquele que jogou com Pelé), Bira, ex Flamengo, Betinho, ex Botafogo e outros ‘bons jogadores’ amadores como Eu (modéstia a parte), e um zagueiro que se não tivesse sido um dos grandes artistas da música popular brasileira, poderia facilmente ter sido jogador de futebol, até hoje conhecido mundialmente como o ‘Miltinho do MPB-4’!
Com esse ‘timaço’, jogamos no estádio do Universidad Guadalajara, ainda em dois clubes que cederam os campos para as seleções que estavam na cidade treinarem, em outros Clubes privados, enfim, nos melhores locais e campos de futebol da região, tudo regado a muita cerveja, churrasco e comida Mexicana patrocinada pelos anfitriões, pois só a presença do Jairzinho era suficiente para atrair público e oferta de jogos até fora de Guadalajara, e só não jogamos mais porque o tempo não dava.
Como ‘Chefe da Delegação’ e ‘titular absoluto da ponta-direita’, eu vistoriava os clubes e os campos e definia o que deveria ser servido ao grupo após os jogos, antes de aceitar os convites! O Jairzinho ‘se escalou’ na meia-direita e eu devo ter sido o ponteiro direito que ‘mais recebeu bola na história do futebol’, pois a meia cancha formada com o Sérgio Lima, Betinho e Jair, mais o ‘Pato Lucas’ na frente, me ‘consagrou’ e fiz dez gols em sete jogos! Era uma farra!
Até que chegou o grande dia, véspera do jogo Brasil x França no Jalisco, e o Jairzinho chamou eu e o Betinho no hotel dele para apresentar um Diretor de um time do México que queria nos conhecer e marcar um jogo no próprio estádio Jalisco, aquele mesmo onde o Brasil ‘mandava’ seus jogos do Mundial!
Fomos até o hotel do Jair, e lá estava ele com esse Diretor do time que queria jogar contra “La selección brasileña de ex jugadores de fútbol en el Estádio del Jalisco”, e fui apresentado pelo Jair como o ‘Chefe da Delegação’ brasileira e que todo o acerto seria comigo. Olhei para o Betinho e já ‘senti que esse tal acerto’ era algo mais sério, e aí quando o homem foi embora o Jair nos contou que vieram oferecer US$ 3.000,00 (três mil dólares) para jogarmos no dia seguinte ao jogo Brasil x França, em um domingo NO JALISCO!
Três mil dólares era o que eu tinha levado para ficar um mês no México naquela época, era muita grana, e dividiríamos entre os três, pois afinal, nós ‘inventamos esses jogos’ e éramos os ‘donos do time’. Os uniformes (que duraram só um jogo, pois tivemos que dar tudo), chuteiras, bolas, eu tinha conseguido tudo com o meu amigo Farlei Ramon, um carioca que havia conhecido em 1982 no Mundial da Espanha e ficamos muito amigos, e que era Diretor da Adidas para a América Latina, a qual patrocinava a seleção brasileira e vários jogadores também. Sobre isso ainda vou contar um dia como iniciou o ‘pagamento’ de patrocínio aos jogadores da seleção na Copa de 82 na Espanha, para usarem chuteiras de futebol de determinadas marcas!
Assim, no dia 21/06/1986, um sábado, dia do jogo Brasil x França de Platini, marcamos de nos encontrar em frente a ‘Puerta 8’, eu, o Betinho e o Jairzinho com o Presidente do Clube com o qual iríamos jogar no Domingo no Jalisco, pois este seria o último jogo daquela fase em Guadalajara; o ‘homem’ chegou e nos apresentamos, combinamos de jantar naquela noite no Hotel do Jair onde ele faria o ‘pagamento’ da quota do jogo, e me disse que iria ainda com ele um Diretor de TV para ver se poderíamos fazer algum acordo para televisionar nosso jogo, mas queria nossa garantia de que a equipe completa iria jogar!
Eu estava tão impressionado com tudo isso, que num misto de euforia e de satisfação, apertei a mão do Presidente do Clube e disse:
– Señor, hay solo una forma de que este nuestro juego no se realice acá en el Jalisco, es que Brasil pierda hoy para Francia, pues ahí no vas encontrar ningún brasileño en Guadalajara mañana, pero quédese tranquilo, no hay equipo capaz de vencer a Brasil en este Mundial!
O Presidente nos saudou, deu um aceno com a mão e entramos no estádio Jalisco dando muitas risadas…
Encontrei-me novamente com o Jairzinho depois daquele Brasil x França somente no Rio de Janeiro no Carnaval de 1987, onde desfilei pela Beija-Flor naquele ano com a equipe do
Fluminense, com Assis e Washington, Tato, Jandir, Delei, Branco, etc… O Betinho ainda vivia em Los Angeles, para onde voltou na mesma noite daquele sábado em Guadalajara, e eu e o Jairzinho demos muitas risadas lembrando ‘do nosso jogo que seria o retorno dele ao estádio Jalisco 16 anos depois’, e até hoje sempre que nos vemos comentamos de alguma forma esse dia 21/06/1986… o resto é história…!